29.3.11

José Alencar (1932 / 2011)

    Uma singela Homenagem
Creio que este poema de CDA, ilustra bem esse momento de perda enorme de todos nós mineiros e brasileiros. José Alencar demosntrou muita resignação e dignidade, sobretudo, uma enorme vontade determinada de viver e sobreviver durante esta década, servindo ao povo brasileiro, numa missão inspirada e grandiosa, como vice-presidente da república, empresário e homem de bem. Que os políticos de nossa nação se espelhem no seu exemplo de homem, empresário e político. Vá em paz José, sua missão foi cumprida!

Click no ícone abaixo e escute o poema declamado na voz do próprio Drumond.








José

E agora, José?

A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José? e agora, você? você que é sem nome, que zomba dos outros, você que faz versos, que ama, protesta? e agora, José?

Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José?

E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio – e agora?

Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora?

Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse... Mas você não morre, você é duro, José!

Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo preto que fuja a galope, você marcha, José! José, para onde?

25.3.11

A Lição da Tragédia Japonesa

Extraido do Blog de Hildegard Angel:

"A preocupação com a segurança no Japão é tamanha que se estuda sobrevivência todos os dias, e isso não é de hoje. Em 1923, quando, em outra catástrofe, morreram em Tóquio mais de 100 mil pessoas, o imperador em seguida baixou um decreto proibindo a fabricação do "tansu" com rodinhas, a cômoda dos japoneses...

Naquele ano, faltavam poucos minutos para o meio-dia quando houve o terremoto, e as famílias se encontravam em suas casas de madeira, reunidas para o almoço, as mulheres à beira dos pequenos fogões no preparo da refeição. Por conta disso, houve muitos incêndios e muitas mortes. E o que tem o tansu a ver com isso?...

Na época, os japoneses moravam em pequenas casas, onde tinham poucos bens e, entre seus objetos, possuiam, normalmente, dois tansus. Um para guardar utensílios de cozinha e outro para roupas e dinheiro. No meio da tragédia, eles deixaram suas casas, que incendiavam, todos com a precocupação de levar seus tansus com rodinhas, o que provocou um grande congestionamento de tansus nas ruas de Tóquio, acarretando ainda mais mortes. Com desprendimento, sem a preocupação de levar seus tansus com os "bens", muitas vidas teriam sido salvas..."


Na tragédia, o povo japonês nos dá a lição de comportamento, respeito, e sobretudo disciplina. As filas são formadas respeitosamente e com resignação, para simples utilização de um telefone público. Não se vê uma cena de agressividade ou saques, como em outras tragédias similares em outros países. Todos de imediato, já se dispõem para dar início a reconstrução de tudo. Diante da dor imposta pela natureza, ali estão eles, dando-se as mãos, amenizando as lágrimas de cada um, proporcionando o conforto mínimo, digno, religiosamente solidários, que nos emociona e nos enche de esperança de que podemos, em todo mundo, ser melhores, ainda dá tempo!

Não há tecnologia ou engenharia que se defenda integralmente desta força que a tudo supera. O mundo caminha para um fim trágico, se não for cuidado de imediato. O terror que virá dos céus e das profundezas da terra, com reflexos nos mares, já dá sinais de proximidades. Na superfície, do planeta só temos feito bobagens para exercitarmos um consumismo medíocre e irresponsável. Extraimos gananciosamente, consumimos tudo e não nos contemos até agora. Desmatamos impiedosamenteas florestas e pouco cuidamos do meio ambiente. Daqui há alguns anos a frente, certamente estaremos lamentando a escassez de água potável em regiões nunca imagináveis. Essa mesma escassez que maltrata milhares e extingue inocentes africanos há anos; nordestinos brasileiros, enfim. Isto é, antes, se não formos extintos em massa, torrados por explosões e contaminações de origem nuclear.

É certo, que ainda há tempo de nos reeducarmos para uma convivência harmônica no nosso planeta e prorrogar mais alguns séculos a existência de vida plena. Que Deus nos ajude e nos desperte enquanto ainda podemos tomar atitudes salvadoras!

23.3.11

Uma Boa do JABOR

"Bom mesmo é ter problema na cabeça, sorriso na boca e paz no coração!
Aliás, entregue os problemas nas mãos de Deus e que tal um cafezinho gostoso agora?
A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso cante, chore, dance e viva intensamente antes que a cortina se feche!"

18.3.11

SONETO ANTIGO

Cecília Meireles

Responder a perguntas não respondo.
Perguntas impossíveis não pergunto.
Só do que sei de mim aos outros conto:
de mim, atravessada pelo mundo.

Toda a minha experiência, o meu estudo,
sou eu mesma que, em solidão paciente,
recolho do que em mim observo e escuto
muda lição, que ninguém mais entende.

O que sou vale mais do que o meu canto.
Apenas em linguagem vou dizendo
caminhos invisíveis por onde ando.

Tudo é secreto e de remoto exemplo.
Todos ouvimos, longe, o apelo do Anjo.
E todos somos pura flor de vento.

Cecília Meireles

SONETO 246 INCONTINENTE - Glauco Mattoso



Soneto é o mundo inteiro em pouco espaço,
mas, para os mais lacônicos, prolixo.
O gosto é variado, e o metro, fixo,
e amante deste oxímoro me faço.

A prosa pesa, empilha um calhamaço.
Concisas poesias são prefixo.
Somente no soneto gravo e mixo
começo, meio e fim, no exato laço.

Qualquer história, fábula ou idéia
comporta enunciado num soneto,
da simples anedota a uma epopéia.

Apenas dois assuntos, eu prometo,
não cabem no soneto: a diarréia
e o pé, mas porque sobram, não por veto.


"Devaneio"
Com Juca de Oliveira


Segunda a Sexta às 9h10 e 17h17

A BandNews FM trouxe para o rádio um fenômeno dos palcos, do cinema, da teledramaturgia e da poesia: Juca de Oliveira, que diariamente brinda os ouvintes com textos escolhidos a dedo para fazer relaxar, fazer refletir, fazer descansar e proporcionar felicidade. Na coluna, o ator interpreta textos da literatura mundial, desde os mais consagrados até os mais contemporâneos, incluindo alguns de autoria própria. Juca de Oliveira descobriu a vocação para ser ator num teste vocacional. E, por causa desse teste, desistiu da faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo. No início da carreira, no TBC, ele fez clássicos como O Pagador de Promessas e A Morte do Caixeiro Viajante. No Teatro Arena, numa linha mais revolucionária, fez Eles Não Usam Black Tie, do Gianfrancesco Guarnieri. Na época da ditadura, revolucionário de esquerda, se auto-exilou na Bolívia. Na televisão, interpretou João Gibão, da Saramandaia, um dos maiores sucessos de Dias Gomes (1974) e atuou em As Pupilas do Senhor Reitor (1995) e O Clone (2001) entre mais de 20 telenovelas. Bom humor e indignação são dois dos atributos dos seus textos no teatro. Caso de "Hotel Paradiso" e "Meno Male". Em "Caixa Dois" e "Às Favas com os Escrúpulos", Juca de Oliveira transborda em suas críticas com relação à política e à falta de ética. É considerado um dos maiores atores do teatro brasileiro. Suas peças ficam em cartaz por anos e, com Meno Male, ele chegou a levar 500 mil pessoas ao teatro. Sua montagem mais recente, Happy Hour, faz críticas atuais ao momento político brasileiro, sem deixar de lado o humor. Um texto de sua autoria, com direção de Jô Soares.

17.3.11

Nesta Crônica,

Lya Luft nos coloca sobre a parede e nos alerta para tomarmos atitudes corajosas, na tentativa de conter, ou de conviver com a loucura do mundo moderno, robótico e hedonista, sobretudo erótico e consumista neste início de século/milênio. Desafio de vivermos mais, com todas as quebras de paradigmas nunca imagináveis, pelos nossos pais e avós. Sobretudo, nos desafia como iremos preservar o bem maior do ser humano: as suas verdadeiras emoções.


Como seremos amanhã ?



"Estar aberto às novidades é estar vivo. Fechar-se a elas é morrer estando vivo. Um certo equilíbrio entre as duas atitudes ajuda a nem ser antiquado demais nem ser super avançadinho, correndo o perigo de confusões ou ridículo.
Sempre me fascinaram as mudanças - às vezes avanço, às vezes retorno a caverna.
Mas hoje tudo "anda" incrivelmente rápido, atingindo nossos usos e costumes.
Nossa visão do mundo se transforma!
Nos usos e costumes a coisa é séria e nos afeta a todos: crianças muito precocemente sexualizadas pela moda, pela televisão, muitas vezes por mães alienadas.
Se antes namorar era difícil, o primeiro batom rosa claro aos 15 anos, e não havia pílula anticoncepcional, hoje talvez amar ande descomplicado demais.
Casamentos estão sendo atropelados pela incapacidade de fortalecer laços, construir juntos com alguma paciência.
Talvez a gente esteja num casa-separa muito rápido, frequentemente deixando filhinhos, que nem pediram para nascer, nem certamente queriam se separar de nada nem de ninguém. São simplesmente levados de um lado para o outro.
Na educação cada dia uma nova notícia, não se reprova mais ninguém e os alunos entram na universidade sem saber escrever, coordenar pensamento, ler e entender.
Dieta, hoje se tornou obsessão.
Em breve estaremos menos doentes, a saúde acho que melhorou muito, porém, teremos de descobrir o que fazer com tanto tempo de vida...
Nada de aposentadoria precoce, chinelo e pijama. Mas, aprender sempre. Interrogar o mundo, curtir a natureza, saborear a arte.
Passear, criar, divertir-se, viajar!
Leremos unicamente livros eletrônicos.
As crianças terão outras memórias, outras brincadeiras, outras alegrias.
Os adultos, novas sensações e possibilidades.
Mas as emoções humanas, estas eu penso que vão demorar a mudar .
Todos vão continuar querendo mais ou menos o mesmo: afeto, presença, sentido para a vida, alegria.
Desta, por mais modernos, avançados , biônicos, quânticos, incríveis, não podemos esquecer...
Ou não valerá a pena nem um só ano a mais, saúde a mais, brinquedinhos a mais.
Seremos uns robôs cinzentos e sem graça !"

(De Lya Luft)




11.3.11

Chaplin (Gênio Raro)

" Se tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades teria ouvido verdades que teimo em dizer brincando, falei muitas vezes como um palhaço mas jamais duvidei da sinceridade da platéia que sorria ".

Charles Chaplin

"A coisa mais injusta sobre a vida é a maneira como ela termina. Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás pra frente. Nós deveríamos morrer primeiro, nos livrar logo disso.

Daí viver num asilo, até ser chutado pra fora de lá por estar muito novo. Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar. Então você trabalha 40 anos até ficar novo o bastante pra poder aproveitar sua aposentadoria. Aí você curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se prepara para a faculdade.

Você vai para colégio, tem várias namoradas, vira criança, não tem nenhuma responsabilidade, se torna um bebezinho de colo, volta pro útero da mãe, passa seus últimos nove meses de vida flutuando. E termina tudo com um ótimo orgasmo! Não seria perfeito?"

Charles Chaplin

"Cada pessoa que passa em nossa vida, passa sozinha, é porque cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra! Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha e não nos deixa só porque deixa um pouco de si e leva um pouquinho de nós. Essa é a mais bela responsabilidade da vida e a prova de que as pessoas não se encontram por acaso."

Charles Chaplin

"O Caminho da Vida

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos.

A cobiça envenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e morticínios.

Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria.

Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco.

Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido".

(O Último discurso, do filme O Grande Ditador)

Charles Chaplin

"Sorri quando a dor te torturar
E a saudade atormentar
Os teus dias tristonhos vazios

Sorri quando tudo terminar
Quando nada mais restar
Do teu sonho encantador

Sorri quando o sol perder a luz
E sentires uma cruz
Nos teus ombros cansados doridos

Sorri vai mentindo a sua dor
E ao notar que tu sorris
Todo mundo irá supor
Que és feliz".

Charles Chaplin

9.3.11

Maior Ironia - (para ler e repassar)

 A maior ironia
Por LYA LUFT - Revista Veja -15/02/2001
Com o ensino cada vez pior - e ainda por cima sendo mais difícil conseguir uma reprovação -, temos gente saindo das universidades quase sem saber coordenar pensamentos e expressá-las por escrito, ou melhor: sem saber o que pensar das coisas, desinformados e desinteressados de quase tudo. Fico imaginando como será em algumas décadas. A ignorância alastrando-se pelas casas, escolas, universidades, escritórios, congressos, senados...
Multidões consumistas ululando nas portas e corredores de gigantescos shoppings, países inteiros saindo da obscuridade - não pela democracia, mas para participar da orgia de aquisições, e entrar na modernidade.
Em algumas coisas sou pessimista: essa é uma delas.Mas acredito que os que ainda quiserem pensar, estudar, descobrir, inventar, pintar, dançar, cantar ou escrever vão viver numa espécie de ilha. Talvez em universidades tradicionais ou ultra-adiantadas, ou no aconchego de bibliotecas em casa, praticamente todas de e-books ou recursos com que nem sonhamos, exigindo pouco espaço.
Já existem em países adiantados intelectuais, pensadores, pesquisadores, cientistas pagos simplesmente para pensar. Criar, inventar, descobrir. Um deles, meu conhecido, cujo hobby é tocar piano, conseguiu, sem ter de pedir, uma sala enorme à prova de som, para tocar altas horas ou de dia, sem incomodar vizinhos.
As atuais agitações em países do Oriente me fizeram pensar que a filosofia (os gregos) foi substituída pela religião, a religião pelas ideologias, e as ideologias, atualmente, pelo consumismo. Não sou contra consumir, gosto do meu celular eficiente e relativamente moderno, embora saiba que em poucas semanas, ou dias, ele estará ultrapassado. Isso não me incomoda. Não me deixa ansiosa por trocar este por outro, que em pouco tempo também deverá ser substituído, numa compulsão idiota. Não gosto é dessa compulsão idiota. Meu computador e meu notebook são atualizados e eficientes, mas não me importa que em algumas semanas estejam superados, desde que funcionem bem.
Gosto de poder trocar de carro quando o outro bate biela (não sei o que é biela mas ouvi falar). Porém, nem posso nem desejo estar sempre com o último modelo, ou o mais luxuoso. Diante da miséria de meu país, acho que isso me envergonharia, como caríssimas joias e bolsas ou roupas de grife. Vivo uma busca de simplicidade, que ajuda bastante a viver curtindo mais e melhor as coisas boas que existem no meio do horror. Podem ser simplíssimas, como um livro interessante, um Mozart profundo, as crianças que correm no jardim de uma casinha que temos na montanha. Um casal de guaxinins fez seu ninho embaixo da varanda, nosso novo encantamento. Se a gente não consegue coisas desse tipo, a vida fica pesada demais.
Corrida demais. Relógios demais, compromissos demais, bebida, comida, contas demais, e de repente a velha prostituta que chamamos Morte revira seus olhos sinistros de gato, limpa os bigodes e prepara o bote.
E nós, onde estamos? Em casa, na cama, na loja, no bar, na praia, na multidão enlouquecida, na solidão do hospital - ou rodeados de alguns afetos essenciais? Ou sozinhos, mas apaziguados? Ou em alguma ilha, que pode ser de artistas ou pensadores dignamente valorizados, ou no minúsculo escritório, ou quarto, em casa, sentindo o contentamento de alguns momentos bons, ou simplesmente refletindo, contemplando?
Vamos ter "aproveitado" a vida, coisa que se aconselha aos jovens desde o tempo de minhas avós - aos rapazes naturalmente, naqueles tempos de moças recatadíssimas -, vamos continuar infantilizados, ou vamos melhorar um pouco como seres humanos? Ou isso tudo não nos interessa nadinha (o que é mais provável)?
O que vai ser, o que vamos sentir, alegria ou tormento, ansiedade inútil ou trabalho de crescimento pessoal, e como vamos enfrentar as unhas afiadas daquela velha dama de gélidos olhos? Quase sempre depende de nós, que giramos feito baratas tontas em busca da última novidade, do mais moderno acessório, da mais louca diversão. E essa é a maior ironia.

4.3.11

Lia Luft ( sobre si mesma)

Ela é assim, sempre lúcida e maravilhosa escritora:

"Sou dos escritores que não sabem dizer coisas inteligentes sobre seus personagens, suas técnicas ou seus recursos. Naturalmente, tudo que faço hoje é fruto de minha experiência de ontem: na vida, na maneira de me vestir e me portar, no meu trabalho e na minha arte/ Não escrevo muito sobre a morte: na verdade ela é que escreve sobre nós - desde que nascemos vai elaborando o roteiro de nossa vida/ O medo de perder o que se ama faz com que avaliemos melhor muitas coisas. Assim como a doença nos leva a apreciar o que antes achávamos banal e desimportante, diante de uma dor pessoal compreendemos o valor de afetos e interesses que até então pareciam apenas naturais: nós os merecíamos, só isso. Eram parte de nós./ O amor nos tira o sono, nos tira do sério, tira o tapete debaixo dos nossos pés, faz com que nos defrontemos com medos e fraquezas aparentemente superados, mas também com insuspeitada audácia e generosidade. E como habitualmente tem um fim - que é dor - complica a vida. Por outro lado, é um maravilhoso ladrão da nossa arrogância./ Quem nos quiser amar agora terá de vir com calma, terá de vir com jeito. Somos um território mais difícil de invadir, porque levantamos muros, inseguros de nossas forças disfarçamos a fragilidade com altas torres e ares imponentes./ A maturidade me permite olhar com menos ilusões, aceitar com menos sofrimento, entender com mais tranqüilidade, querer com mais doçura./ Às vezes é preciso recolher-se. Obs.: Sobre ela mesma" ~ Frase de Lya Luft
OS ESTATUTOS do HOMEM

( poema de Thiago de Mello)
(Acto Institucional Permanente)


Artigo I

Fica decretado que agora vale a verdade. Agora vale a vida e, de mãos dadas, marcharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo II

Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive as terças-feiras mais cinzentas, têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo III

Fica decretado que, a partir deste instante, haverá girassóis em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra; e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro, abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo IV

Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem. Que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu.
Parágrafo único:
O homem, confiará no homem como um menino confia em outro menino.

Artigo V

Fica decretado que os homens estão livres do jugo da mentira. Nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem a armadura de palavras. O homem se sentará à mesa com seu olhar limpo porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa.

Artigo VI

Fica estabelecida, durante dez séculos, a prática sonhada pelo profeta Isaías, e o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.

Artigo VII

Por decreto irrevogável fica estabelecido o reinado permanente da justiça e da claridade, e a alegria será uma bandeira generosa para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo VIII

Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água que dá à planta o milagre da flor.

Artigo IX

Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal de seu suor. Mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura.

Artigo X

Fica permitido a qualquer pessoa, qualquer hora da vida, uso do traje branco.

Artigo XI

Fica decretado, por definição, que o homem é um animal que ama e que por isso é belo, muito mais belo que a estrela da manhã.

Artigo XII

Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido, inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com uma imensa begônia na lapela. Parágrafo único: Só uma coisa fica proibida: amar sem amor.

Artigo XIII

Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar o sol das manhãs vindouras. Expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de cantar e a festa do dia que chegou.

Artigo Final

Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas. A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem.

Thiago de Mello, Santiago do Chile, Abril de 1964

3.3.11

Soneto de Carnaval - Vinicius de Moraes

Distante o meu amor, se me afigura
O amor como um patético tormento
Pensar nele é morrer de desventura
Não pensar é matar meu pensamento.

Seu mais doce desejo se amargura
Todo o instante perdido é um sofrimento
Cada beijo lembrado uma tortura
Um ciúme do próprio ciumento.

E vivemos partindo, ela de mim
E eu dela, enquanto breves vão-se os anos
Para a grande partida que há no fim

De toda a vida e todo o amor humanos:
Mas tranqüila ela sabe, e eu sei tranqüilo
Que se um fica o outro parte a redimi-lo

2.3.11

Abaixo divulgo alguns poemas e textos de dois mineiros singulares, Carlos drumond de Andrade e Guimarães Rosa:

Confidencia do Itabirano - CDA


Alguns anos vivi em Itabira.

Principalmente nasci em Itabira.

Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.

Noventa por cento de ferro nas calçadas.

Oitenta por cento de ferro nas almas.

E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,

vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.

E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,

é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas que ora te ofereço:

este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;

este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;

este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.

Hoje sou funcionário público.

Itabira é apenas uma fotografia na parede.

Mas como dói!

CDA - Quando é Dia de Futebol



Futebol se joga no estádio?
Futebol se joga na praia,
futebol se joga na rua,
futebol se joga na alma.
A bola é a mesma: forma sacra
para craques e pernas-de-pau.
Mesma volúpia de chutar
na delirante copa-mundo
ou no árido espaço do morro.
São vôos de estátuas súbitas,
desenhos feéricos, bailados
de pés e troncos entraçados.
Instantes lúdicos: flutua
O jogador, gravado no ar
- afinal, o corpo triunfante
da triste lei da gravidade.

In Poesia errante

CDA - (de novo)

Poema De Sete Faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
Pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos não perguntam nada.

O Homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

CDA

CIDADEZINHA QUALQUER


Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.

Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar ... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus.