O Tempo e as Jabuticabas
Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver
daqui para frente do que já vivi até agora.
Sinto-me como aquele garoto que ganhou uma bacia de jabuticabas.
As primeiras, ele degustou displicente,
mas percebendo que faltam poucas,
rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir
quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para projetos megalômanos.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis
para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias
que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres
de pessoas que, apesar da idade cronológica, são imaturas.
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram
pelo majestoso cargo de secretário geral do coral.
Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou:
'as pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos,
quero a essência, minha alma tem pressa...
Sem muitas jabuticabas na bacia,
quero viver ao lado de gente humana, muito humana;
que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos,
não se considera eleita antes da hora,
não foge de sua mortalidade,
defende a dignidade dos marginalizados
e deseja tão somente ser feliz.
Ricardo Gondin
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